Olá !!

... este é um espaço de exercício da escrita, sobretudo. A escrita, na plenitude do momento que dita a sua forma: Prosa, verso; Ou que dita o seu gênero, o seu tamanho, elasticidade, duração ou a sua emergência. A escrita que traga, de algum lugar, qualquer coisa que insista em existir ...

Comente, troque textos, inscreva-se, opine. Será um grande prazer dividir com você esta experiência.

Abraço de Águia !


sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Elvis não morreu

Em algum lugar do nordeste brasileiro:

- Olá ! – diz, repentinamente, um homem de seus cinqüenta anos, dirigindo-se estupefato a uma  mesa já ocupada de um quiosque à beira mar; sem camisa, usando uma bermuda colorida e um turbante com  tubo amarelo para guardar chaves e dinheiro enrolado.

- Quem é você ? – Responde o outro, sentado, a devorar uma porção de mariscos e outra, "king size", de bananas fritas, douradas e macias, por baixo de óculos escuros fenomenais.

- Quem sou EU ?! Você é o Elvis ! Elvis Presley!

- "Oh, please: Sitdown..." - Acalmou-o, Elvis, tomando o homem pelo braço - Pegue “um desses” .“ So gorgeous”, bem passadas... - completou ao beliscar uma banana com um charuto entre os dedos que  hospedavam, dentre tantos, um anel na forma de uma esfinge, cravado de diamantes.

- Meu Deus ! O que você está fazendo aqui ?! – continuou o homem, salivando uma felicidade  depreciativa e apressando-se para mostrar um chaveiro como prova de sua idolatria.

- Fale mais baixo. – Sobreolhou Elvis, separando com as mãos as cascas de um mexilhão voluptuoso – Você não vai me delatar, “no” é "amigou" ? - emendou, alisando uma medalha  ao peito com simpatia, e dando uma piscadela inconfundível até para quem nunca viu o rei do rock and roll. 


- Você é mesmo o Elvis !! - cochichou, alarmado, o homem a um palmo de seu ouvido.

- ... Coma, estão da "mouléstia”, como dizem aqui... "Oh, God": Adoro brasileiros! ... É que eu estava precisando de férias. - Continuou, impávido -  "Muitos" férias. Eternas, para dizer "o" verdade, "daquele" vidinha vulgar: "Girls, money, more gilrs and money..."  "Esse" vida acaba com a "gentche"... - falou, dando um tapa "blasé" diante do rosto -  "Oh, God!" " Nou quiero" dinheiro, eu só "quiero" amar!

- E você anda assim !? As costeletas ?! Este topete ..., a gola da camisa, estes anéis gigantes!? Ninguém nunca te pegou ? - Disse o homem, ao tocar o topete esculpido como se diante do teto da Capela Sistina, num ensaio de cumplicidade.

- Oh, você é gay. – Arrematou, Elvis, erguendo um lado superior da boca e largando o seu guardanapo de papel no prato.

- Não, eu não sou gay...

 – Você quer tomar alguma coisa ? Vou pedir para o meu "amiga" Raimundo... - interrompeu, Elvis, arqueando as sobrancelhas  - ...“Esse” caipirinha de lima "do" Pérsia é “fantástiou”! - completou , ao morder o charuto - ... Mas você...

- Não, eu não ... - defendeu-se o recém chegado.

- Raimundo!, mais duas... - Chamou Elvis, tocando a feição boquiaberta do homem com o seu braço tatuado com a bandeira dos Estados Unidos, o Zé Carioca e adornado por tremendas pulseiras maciças  - ..., e como estão "as" camarões hoje ? - voltando-se ao atendente.

O jovem e sorridente garçom, de sunga e chinelos,  estendeu o polegar e abriu largamente o indicador, mostrando uma espécie de gesto vulgar a Elvis que, por sua vez, colocou as mãos cruzadas ao peito e jogou a cabeça para traz, arrebatado pelo tamanho dos camarões indicados:

- Uau! Você divide comigo "um" porção ao alho e óleo ? - redarguiu, Elvis, por cima das lentes descomunais e azuladas, ao homem arqueado diante da mesa.

- ... É que você é o Elvis! E com essas costeletas !? ...

- “Essas costeletas”..., “Este topete”, os anéis... ui ui, “Santa”. Hã Hã ! ... Bem, vou querer uma desses graúdos ao alho e óleo e ... uma dúzia de ostras ! "  Oh, God! Você tem que ver as ostras que eles têm aqui. Raimundo, traga aquela malagueta "and, look" - falou, chamando a atenção do garoto que encaixava o seu talão de pedidos ao elástico da sunga e a caneta à orelha: 


- "Ua báb lula bulá bam bum!!" - Gesticulou-se inteiro e de supetão, Elvis, a fazer cara de Elvis, para deleite do rapazola com um crachá: "Severino", que partiu meio envergonhado e num salto de alegria para o modesto quiosque à beira da praia, com a bandeja em baixo do braço.  

- Oh, ele adora isso! - completou , o rei, às raias de um colapso de risos -  A-do-ra! "I love Brazil! It's good. Oh, my God! It's really funny." E quando eu faço o "Hound dog", com o mindinho ?! Oh, God! - arrematou engasgando. - E “no, no” ... ninguém me pegou antes. Comigo não tem “esse” história de me pegar, “no”... a minha praia é outra...

O homem abocanhou uma banana frita e um marisco, um tanto aéreo.

- Oh, quando eu faço o "Hound dog".... ?: You ain't nothin' but a hound dog. Cryin' all the time" ! - encenou de improviso a todo pulmão e gesticulando o mindinho como um dançarino frenético -  Oh!  Good kid,... Oh, "God"!, é muito divertido. E a comida que servem é excelente: Você vai ver o tamanho "das" camarões!

- Isto é inacreditável - pasmou-se o homem, antes de concluir - Eu estou à beira mar conversando com você, Elvis Presley! Ninguém vai acreditar.

- Oh, "no"... - Diz Elvis, passando uma fatia de pão com "catchup" na travessa quase vazia das bananas –  As pessoas "náo váo" acreditar. E “o seu reputaçáo"...? Vão dizer que está se drogando... perde "a" respeito...."no" vale a pena. Depois eu faço o "Hound dog", pra você de novo. Oh ! ....  Vamos, "náo" fique com vergonha: Coma. - disse enfiando alguns mariscos e uma banana oleosa entre duas fatias untadas com pasta de amendoim e chocolate, para abocanhar o sanduíche com toda a majestade.

Paulo Gustavo

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Nome

Vejo o meu nome escrito em um envelope sobre a mesa, no meio dos papéis. Leio os dois primeiros e ignoro os demais – os que não são eu -. Eu sou os primeiros: Os próprios, o composto. Os que combinam - ou deveriam. Os outros são como adjetivos ou espécie de elogios exagerados. Quase os ignoro, enquanto me observam. Desvio-me das suas letras.

 Os meus, os dois primeiros, são por mim relidos com afeição e saudade. Aqueles, os outros, enxergam; Estes são condescendentes, espiam. Aqueles, tribunais onde cada letra é um olho aberto. Oficiais rigorosos, expressos e atávicos como não pretendem ser os primeiros - meus bons nomes, dois meninos que se combinam, e vez ou outra se revezam, para eu me chamar.

Paulo Gustavo 

domingo, 7 de março de 2010

Um domingo qualquer sem Al Pacino

O júri dos Nardoni.Dia 22. Destaque para um grupo de manifestantes twiteiros que, de última hora, passa a pregar a inocência do precondenado casal de réus.6 morrem e 40 famílias desabrigadas no Rio. E os ventos continuam a ameaçar a mais de 100km por hora; O Chile continua tremendo e espalhando o terror e o toque de recolher foi reduzido. De outro lado, estas tragédias costumam arrecadar fundos.


Na rodada, o Santos faz um verdadeiro clássico contra a Portuguesa; E o Vasco, no Rio inundado, o Cruzeiro, na grande Belo Horizonte, bem como o Internacional, em Porto Alegre, tchê!, estão em campo.Uma pilastra cai no Macaranã.


Nos Estados Unidos a espera pelo Oscar que logo mais, lá penas dez horas, vai passar na televisão. O tenista Novak Djokovic classifica a Sérvia em uma disputa contra um americano. Alice, no país das Maravilhas, bate recorde de bilheteria em seu país.E por falar em recorde: no basquete, agora a pouco no Rio de janeiro, Marcelinho também bateu: Marcou 63 pontos no jogo com o São José, enquanto um jogador de futebol nigeriano, o jovem Idahol de 25 anos, deixava este mundo também em campo no meio da partida contra o time Al - Amal, provavelmente de um infarto fulminante, entristecendo o campeonato senegalês - ao passo que o Massa está inquieto com as novas equipes, no mundo da fórmula 1.


Um mendigo bate-me à porta. Entrego-lhe um pacote de bolachas e um molho de tomates - somente mais tarde perguntei-me se ele possuía panelas.


O técnico que me emprestara a tv até que a minha fosse consertada acaba de passar, de certo vindo de um churrasco ou de uma pescaria e deu sorte,viu-me aqui sentado à janela da sala e entreguei-lhe o controle remoto aqui esquecido na destroca: " Oh! Dei sorte!, disse-me estendendo-me a mão amigavel e apressada. "Boa semana!", trocamos com sorrisos positivos. Mais um amigo, pensei. E ele também, enquanto o Kassab diz que falta pouco para o circuito de fórmula Indy ficar pronto.


No Big Brodher, a equipe laranja fatura a prova da comida quando milhares de pessoas protestam contra o aborto em Madri, e o Irã inicia a produção de míssil de curto alcance e as eleições no Iraque terminam com 38 mortos. A cidade está sendo atacada principalmente por foguetes de distritos sunidas de Bagdá, segundo o general porta-voz das forças de segurança que afirmou:"Estamos em estado de combate. Estamos operando num campo de batalha e nossos guerreiros estão preparados para o pior", afirmou certamente desconhecendo que a poesia marginal dos anos 70 ganhou a antologia "Destino:Poesia" e dialoga com novos poetas, pela José Olympio.

A tarde vai caindo e o Guns'n Roses inicia a sua turne aqui, em Brasília, onde está a carta enviada pelo governador Arruda - como se arruda desse mesmo alguma sorte - , reclamando contra a abertura do seu impeachment. Amanhã começa a vacinação contra a gripe suína..., mas pelo menos no siri_ Lanka uma artesã decora os vasos das comemorações do dia da mulher próximo, como aparece no site do Uol. 

Não dá pra negar que o universo é um organismo fervilhante que nos faz pensar que, de longe - como se vendo da nave de Armstrong - a camada humana é uma espécie de húmus processante, consumindo e gerando como uma esponja elétrica, pulsante e viva. Ao mesmo tempo aeroportos, avenidas, shopping centers, hospitais, delegacias, parques e prisões. Imaginemos o poder do mínimo movimento respiratório desse oceano humano, em silêncio e a respirar compassado. Ao fundo, a terra a suplicar, nauseada como uma velha moribunda esquecida no corredor do Sistema Único de Saúde. E tudo isso apenas hoje, um domingo qualquer sem, sequer, um ataque de nervos do Al Pacino para se ver na televisão... 

Domingo 07 de março de 2010 - Fonte: Portal Uol.

Paulo Gustavo

  





quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Pai..., " Só não quero e não vou ficar mudo, pra falar de amor pra você"...

Hoje é seu aniversário. Mais um. Sessenta e ..., quase me fogem os números dos anos. Sessenta e nove. Bem hoje. Agora, pai. Ano passado você já havia ficado invisível e perdeu-se a graça do seu aniversário. Você sabe como são as coisas..., você sempre disse que elas seriam assim mesmo e acertou mais uma vez. Quanto à saudade grande, aquela que aperta uma bexiga de ar dentro do coração e que esfria a nuca e molha os olhos - do estômago à boca - , sobre esta o senhor não contava ..., e eu também não. É verdade que no correr da vida eu até procure não pensar muito nessa história de se ficar invisível - porque, embora seja uma velha história, ela nunca é contada direito. É confusa e viscosa; um pouco obscura e cheia de personagens, sentimentos e emoções. Não é uma boa história pra se ficar pensando a todo instante, na visibilidade.

Mas hoje é mais um aniversário seu, Papa. Parabéns! Inevitável que eu aqui estivesse a ouvir a sua música preferida - que eu gravei, inclusive cantando, em um cd pra que você ouvisse a minha voz no carro, em casa, na estrada, na varanda da fazenda. Também foi um presente de aniversário. O que me desculpa é o fato de que a pureza da intenção seduz os sentidos da razão, e eu sempre fui feliz por você ter gostado. Mas, convenhamos, dei algumas desafinadas. Pelo menos três a impressão dos anos não me permite soterrar, sendo uma delas - um agudo constrangido lá pelo final - de alguma gravidade musical e digna de um abacaxi ou, mesmo, de um bacalhau. O importante é que você gostou e, confesso, eu também! ..., Eu te amo. E te amo muito, você sabe. Eu sempre te disse. Sempre. Que bom ! O nosso amor continua sendo explícito. Um baita Amor. Um verdadeiro Amorzão, que me faz te amar ainda mais.



Parabéns, meu velho. Meu herói. Meu bandido, estamos juntos: Aqui e aí. Veja a Luz e siga as placas. Lembre-se da Belém-Brasília rumo ao Araguaia: "Manda o pau, campeão! ","Segura, carroceria, senão você fica! ... Sempre em frente. -... Digo isso como se eu não imaginasse que você sabe dessas coisas e histórias melhor do que eu... - Eu te amo de novo. Te amo todos os dias e especialmente nos seus aniversários. Neles te amo mais, porque eles comemoram o dia em que você nasceu.


Aquele nosso beijo e aquele abraço nosso, apertado, agora.


Paulo Gustavo
26.02.2010

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

PEDAÇO DE MIM ( Inspirado na música de Chico Buarque de Holanda)


O casebre da floresta parecia se alargar a cada dia. A perna faltava mais ao passo dos anos e Maria, deles, já tinha oitenta que bem acomodavam um centenário às suas rugas de pudim e ao seu andar morto – da esteira ao buraco; da cozinha às galinhas, à horta. Das cruzes aos retratos e, destes, às santas e à dispensa, por uma eternidade - . O andar de cima, acessível pela tenebrosa escada de madeira sem lei, há tempos só era visto dentro da cabeça, encaixado aos rostos das fotografias, embora fosse, sempre à noite, constatado pelos grunhidos dos invisíveis que dele se alimentam, ela conclui.


Com o vento das cinco ou seis o corvo pousa na calha. Ela tem que abaixar e apertar a banguela para vê-lo. Antes – Ara,corvo! -, furiosa. Girava o pano de prato, o cajado, e ele ia embora. Mais tarde, planejou com um caminho de girassóis até o pé de uma foice; e, no inverno, passou a deixar frutas que a ave desprezou para deixar clara a intenção de sua espreita. E por todo o resto da tarde, e até amanhecer o dia, o corvo petrificava-se ora ali, ora ao galho da mangueira que sombreava a cozinha, ora sobre a manivela do poço, como ela reparou ultimamente, e ia embora, quando o dia labaredava.


A raiva toda já passara. Restava o incômodo daquela vigília. Macabra. Maria tratava de ficar em casa ao escurecer. Permanecia na varanda oposta, onde o corvo não a via e ela podia esquecer o seu martírio. Fumaçava uma palha imersa em orações, até quase flutuar pelo vento da noite, quando então se arrastava velha até a esteira de dormir. Há dias ela tem ensaiado uma ironia que não é sua e dado boa noite ao corvo. Às vezes, deitada, ela espalma uma mão e bate o cajado inclinado em direção a cozinha. Nem ela se reconhece. Esparrama-se, constrangida, e adormece até o dia, pressentindo a ave.


Na escuridão dos sonhos, os retratos - sempre eles. Irados, também, com o silencioso visitante, e rabugentos como só eles, os retratos. Milhares de conversas simultâneas, o Jorge! Era um nome tão bonito, pobre ventre. De passarinho, como o de sua mãe. Pior é o retrato de Jorge, que aparece só de noite na cabeça e gira, gira e quase faz vomitar, pesado centenário. - Uns quatro, se fizer as contas. Mas um só é bom. Os outros, insuportáveis onde falta a perna. - Jorge estalado no chão, no meio da poça, em cima da esteira virgem. E depois do Jorge, a câmera lenta: O homem de chapéu que sai pela porta estranha, sem os olhos e a voz mais invisível ainda. A espora que acorda o cavalo e a poeira grande demais para aquele dia santo. A bexiga enche de uma vez dentro do peito e ela desperta novamente com a boca marrenta, cobre as costas para outra dor antes de levantar-se de uma vez.


Na primeira hora, tira a poeira que não existe. Reza e chora; come, toma chá. Confia que o espectro não está lá e, assim: Às santas, à cozinha, às cruzes no fundo do quintal e, delas, a tudo o que não existe. Depois ao corvo e, dele, aos retratos, ao sono, a Jorge ..., e ao dia, e sempre,  de novo.                                                                   


Autor: Paulo Gustavo